Continuidade dos acidentes com mortes. Congestionamentos em determinados horários – principalmente em feriadões. Encarecimento da obra em R$ 30 milhões do previsto no início do contrato. Estes são apenas alguns dos reflexos no atraso da duplicação da principal rodovia do Vale do Taquari: a BR-386.
São 33,4 quilômetros de obra. Quando concluídas, o trecho entre Tabaí e Estrela contará com pista dupla em ambos os sentidos, o que facilitará o tráfego de veículos e diminuirá os riscos de acidentes na chamada Estrada da Produção. Tudo isso poderia estar pronto se as autarquias dessem a devida atenção à principal obra estrutural do Vale do Taquari.
Iniciada em 2010, a previsão era para que estivesse pronta em outubro de 2013. Atrasos nas liberações de jazidas, na entrega de viadutos e na construção da aldeia indígena emperraram o processo. O que se vê é um canteiro de obras entre as duas cidades que devem continuar até maio de 2014. É o que garante o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit).
Dados apontam que 70% da obra está concluída. A partir de janeiro, serão inaugurados os primeiros 22 quilômetros do trecho duplicado. Em alguns pontos, faltam apenas as sinalizações horizontais e a junção com a pista já existente. Nove quilômetros permanecem em obras e os restantes dos trabalhos só ocorrerão quando a autarquia federal concluir a licitação para construir a nova aldeia indígena.
Mesmo assim, o andamento da obra causa irritação em líderes locais. O presidente da Câmara de Indústria, Comércio e Serviços do Vale do Taquari (CIC-VT), Oreno Ardêmio Heineck, afirma ser incompetência por parte do ex-superintendente do Dnit, Vladimir Casa. “O atual superintendente, Pedro Luzardo Gomes, mostra esforço e competência, mas herdou uma obra com problemas burocráticos imensos atrasados, muito por culpa de seu antecessor.”
Sobre o Dnit recai, também, a demora em desapropriar, indenizar famílias e concluir algumas obras, como o viaduto em Tabaí. Além, claro, de atrasos nos pagamentos do consórcio construtor – que já foi regularizado.
As críticas também são dirigidas à Fundação Nacional do Índio (Funai), que endureceu com as autarquias federais. A Funai só deixa iniciar a obra em outros dois quilômetros quando houver garantias de que as famílias da tribo caingangue, que mora às margens da BR-386, em Estrela, serão realocadas para uma nova aldeia segura.
“A Funai é um órgão totalmente ideologizado, ultrapassado e radical. Um pedaço do desenvolvimento do país tranca na Funai.” Heineck volta a defender a extinção da entidade.
A falta de quadro técnico no Instituto do Patrimônio Histórico Nacional também não saiu ilesa. Há apenas um técnico para atender o Estado e muitas obras necessitam do aval deste profissional para continuar os trabalhos.
Prejuízo econômico
O consórcio construtor bradava que conseguiria concluir a obra em 2012. O Dnit sempre disse que respeitaria o cronograma e concluiria em outubro deste ano. Nenhuma das duas previsões foram atendidas. “Podemos, certamente, falar em um atraso real de até dois anos, porque o Dnit cumpriu pouca coisa do que prometeu”, esclarece Heineck.
O dirigente ressalta que o atraso também afeta os planos da região para com a Copa do Mundo. Para Heineck, a demora em concluir a duplicação fez as seleções que vêm para a Copa do Mundo de 2014 sequer pensar em vir para a região. “A BR-386 era um dos grandes argumentos.”
Heineck ressalta que não houve prejuízos políticos na região. Diz que todos fizeram o possível para que a obra seguisse, ao menos, dentro do cronograma. “A partir de outubro, cada acidente devido à pista não duplicada pode ser imputada aos órgãos federais culpados pelo atraso.”
“Quais acidentes?”
A reportagem entrou em contato com o Dnit na segunda-feira, dia 4, para solicitar respostas a algumas questões que angustiam a comunidade. Foram necessários três dias para que a autarquia respondesse, de forma displicente. Por meio da assessoria de imprensa, o órgão federal é sucinto em todas as respostas.
“Não há reclamações” é tudo o que tem a dizer, quando a pergunta é sobre a articulação do Dnit com os órgãos criticados anteriormente, como a Funai e o Iphan. Também parece desconhecer que o atraso na obra também apresenta perigo a motoristas e pedestres.
Ao ser perguntado sobre a possibilidade de familiares de vítimas entrarem com processos contra o Estado e a União em decorrência de acidentes, a resposta é outra pergunta: “Quais acidentes?”.
Só neste ano, foram pelo menos três mortes no trecho a ser duplicado. Em maio, uma pessoa foi atropelada por um caminhão – que não prestou socorro – próximo ao viaduto de Fazenda Vilanova. A estrutura recém havia sido liberada para os veículos, mesmo que com pouca sinalização.
Outra morte ocorreu próximo em julho da praça de pedágio da BR-386. Ao fazer uma ultrapassagem, o motorista de um caminhão colidiu contra um Pálio, que seguia no sentido contrário. O local era para estar concluído naquele mês.
Inauguração em janeiro
A presidente Dilma Rousseff não gostou do andamento da obra – e de outras que estão sob gestão do governo federal – e, em reunião com ministros, cobrou mais agilidade. Em janeiro, serão inaugurados os primeiros 22 quilômetros do trecho duplicado.
A cobrança tem um sentido: na segunda metade do primeiro semestre, políticos estão proibidos de participarem de inauguração de obras, sob risco de terem as candidaturas impugnadas pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE).